sábado, 8 de maio de 2010

ESTRELA RELUZENTE

Evan Bessa
(À minha mãe)

Na via-láctea surgiu um ponto luminoso
Banhando a terra com uma luz visível
Da estrela que subiu, de brilho harmonioso,
Filigranas de prata caíam em gota indivisível.

Ela subiu ao etéreo, num dia de sábado
E nos deixou órfãos, sem rumo, tristes.
Encerrou um ciclo pleno de felicidade
Seu vôo rasante se fez depressa na subida.

Que momento doloroso foi a partida!
Um corpo frágil dormia sereno, em paz.
E nós, seus filhos dilacerados pela dor,
Sofremos ao vê-la alçar o vôo definitivo.

Sua ausência tornou-se presença viva
Num instante volátil do pensamento,
A separação nos tornou mais próximos
Da mãe, do Anjo protetor, da Diva...

Saudade... Saudade... é o nome do barco
Que carrega o sentimento e a dor atroz,
Dos seus filhos, nesse mar de tormenta
A percorrerem milhas, em lamento.
Inversão de Valores: Amor X Consumismo

Evan Bessa


Escrever algo original sobre o Dia das Mães, sem cair nos mesmos clichês, ou chegar às vias da pieguice, parece um trabalho difícil, isso porque, ano a ano, se retoma o tema, e, sem se dar conta, comete-se os mesmos erros, ou seja, repete-se o velho.

Qual a singularidade que esta data impõe à sociedade? Nenhuma. Ao contrário, motiva e revitaliza o consumismo exacerbado que, nessa época, é visto como prova de amor e de carinho da família pela matriarca. O comércio e a indústria se mobilizam para oferecer mirabolantes promoções a fim de agradar e satisfazer os mais exigentes gostos. Quanto mais caro o presente, melhor, pois os códigos que sinalizam a sociedade de consumo aferem a escala de medição de acordo com os ditames mercantilistas.

Onde se encontra o significado e todo o simbolismo que a data representa? Qual a reflexão que se faz do valor e da verdadeira expressão da pessoa que se homenageia? Quais os valores que pesam na balança das famílias no mundo moderno? São questões que são levantadas e para as quais não se encontram respostas, pois nada disso tem realmente relevância diante dos apelos do cotidiano.

A função social que uma mãe desempenha na família é de suma importância. O seu papel como mulher, elo entre marido e filhos que se constrói e se desconstrói, diariamente, pela sua capacidade de amar e de administrar a casa, os conflitos que surgem e, ao mesmo tempo, sua habilidade para compor e recompor os afetos as emoções desgastadas no círculo familiar, não é tarefa fácil.

Essa mulher multifacetada tem consciência de que um dia só em sua homenagem não representa a realidade pontual e concreta que deve ser atribuída às suas funções, como mãe e mulher, as quais envolvem toda uma complexidade também difícil de se entender pela sua verdadeira dimensão diante do mundo.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Revisitando o Passado

Evan Bessa

Não faz tanto tempo assim, mas algo me diz que estou enganada. O tempo passou há muito e parece que não atinei para o fato. A vida correu numa velocidade incrível e a dinâmica do cotidiano nos deixou na roda viva. Assim, não se percebeu o grande número de acontecimentos que nos assaltou a toda hora. A impressão, quando criança, é que o tempo não passa rápido. Queremos a todo custo aumentar a idade para nos tornarmos jovens e adultos o mais rápido possível. Ficamos ansiosos e, muitas vezes, se perde o sono pensando nas mudanças que poderiam ocorrer, caso tivéssemos plenos poderes sobre ele. No entanto, somos reféns desse senhor que rege o calendário. Vivemos, quase sempre, em função dele, alinhando fatos, eventos, regulando o relógio a nosso favor, pois, caso contrário, perdemos completamente o controle da situação.

Lembranças da infância revisitam nossa memória e parece que não ficaram tão longe. As brincadeiras infantis, as férias na casa dos avôs, os amigos que deixamos para trás, a escola e os professores que passaram em nossa vida e até a cidade na qual nascemos, provinciana e sem muito atrativos, chega clara, límpida feito cristal quebrado, mas que ainda conservamos a poeira do que nos restou.

A adolescência volta à cabeça com toda aquela turbulência de dias vividos sob a égide da insegurança, do medo, das angústias. Período de tensões, mas também de sonhos, amores platônicos e sucessivos arroubos juvenis. As primeiras experiências que não deram certo trazem sentimentos confusos, desilusão, medo de recomeçar e/ou partir para outras. Não se tem maturidade para tomada de decisões mais sérias e, diante do adulto, temos um pouco de desconfiança. Nessa fase achamos que ninguém nos compreende, nos dá valor ou escuta de bom grado nossas dúvidas e incertezas. Esta travessia não é fácil! Deixa marcas profundas que demoramos superar, principalmente quando se trata de coisas íntimas, do coração e da alma. É o alvorecer de uma existência que se apresenta plena de enigmas.

Na idade adulta tudo vai se acalmando lentamente. Conseguimos parar para pensar, refletir sobre algumas idéias e deixar amadurecê-las, a fim de tomar posicionamentos e decisões. Isso varia de pessoa para pessoa, porque vão pesar aqui as experiências exitosas ou não, e o fato de ter apreendido a administrar e superar os desvios e meandros que a vida jogou durante o plantio da nossa existência. Dos 25 aos 50 anos vivemos plenamente com os pés fincados no chão, levando queda, se levantando e partindo para novas conquistas no campo pessoal e profissional. Realizamos muitas coisas, estamos plantando, colhendo e pavimentando a quadra seguinte e as décadas que vão chegando. Sentimentos parecem mais maduros, as angústias e incertezas continuam, porém nos sentimos capazes de gerenciar a maior parte delas. Vamos adquirindo “pari passu” confiança em nós mesmos e assumimos responsabilidades cada vez mais complexas.

Quando atingimos a terceira idade, olhamos para trás e percebemos o que conseguimos e isso nos remete a refletir sobre o outono da vida. O que estamos colhendo no jardim que semeamos e regamos nos verdes anos? Soubemos pavimentar essa estrada para uma caminhada mais longa e sem perigos? O que nos espera? Não podemos dizer o que nos aguarda, porque não se sabe até onde podemos chegar, se existe um futuro... Todavia, se as fases anteriores foram vividas prazerosamente, superando desafios e procurando a felicidade dentro de nós mesmos, então teremos capacidade de envelhecer com dignidade e entender que a vida é cíclica e o círculo fecha quando partimos definitivamente para um plano diferente.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

MILAGRE DO AMOR

Evan Bessa


Estrelas caídas aos pés da amada
Cintilam como pluma ao vento
E do céu a envolvem como fada
A mulher, no altar do sentimento.

A graça desce do céu, no momento
Exato, para resgatar esperanças
Que não estava há muito tempo,
No bailado suave das andanças.

E aqui, diante do chão estrelado
Vejo a amada a olhar extaseada
O milagre do amor revelado
Depois da tenebrosa caminhada.
A BIENAL COM O OLHAR VOLTADO ÀS NOVAS GERAÇÕES

Evan Bessa


Acompanho a Bienal Internacional do Livro desde o início de sua instalação em nossa capital. Tenho observado que a cada evento está havendo maior receptividade por parte do público. Adultos, jovens, adolescentes, crianças lotam os pavilhões do Centro de Convenções atentos, curiosos e sempre querendo se informar e participar da programação oferecida.

Este ano o tema é bem sugestivo: “O livro e a leitura dos sentimentos do mundo”. Uma homenagem está sendo feita à escritora Rachel de Queiroz, na passagem de seus 100 anos. A motivação torna-se ainda mais atraente, uma vez que além da autora ser cearense, sua obra é rica e múltipla, voltada sempre às raízes, ao seu povo e à sua gente.

O que reputo de uma importância fundamental nas bienais é que o fluxo de crianças e jovens das escolas vem aumentando significativamente. Há um incentivo por parte das autoridades e gestores escolares, no sentido de que cada aluno adquira livros a seu gosto para, de fato e de direito, tornarem-se verdadeiros cidadãos e leitores. Fomentar o hábito da leitura desde cedo é uma necessidade primordial; pais e professores devem propiciar essa aventura deliciosa aos filhos e alunos. E o que vemos a todo instante na Bienal são escolas com alunos de todos os níveis de ensino, visitando os stands e participando das atividades. Olhinhos buliçosos percorrem os vários painéis e balcões de livros coloridos espalhados ao longo da feira. A animação e a curiosidade dos pequenos leitores que estão despontando sugerem que as gerações futuras terão uma maior predisposição para fazer do livro o companheiro dileto - o amigo de todas as horas, o objeto de desejo.

O ato de ler com compreensão, sabendo interpretar um texto, é, ainda, uma das maiores dificuldades encontradas em sala de aula. A dificuldade na leitura compromete as demais habilidades e competências no ensino e na aprendizagem cotidiana.

Vejo com bastante entusiasmo e otimismo o caminhar desses novos leitores na busca da cidadania e do poder de informação. O livro como investimento para uma população, onde o acesso a esse material ainda se constitui objeto muito caro, não deve ser privilégio de alguns, mas estar disponível a todos. Poucas famílias podem proporcionar aos seus filhos uma pequena biblioteca em casa; a maioria dos alunos só conta com o acervo que existe nas escolas. Hoje, tenta-se modificar essa realidade.

Mesmo no mundo em que vivemos de grandes avanços e inovações tecnológicas, nada substituirá o prazer de ter um livro em mãos, viajar nas suas histórias, conhecer lugares, descobrir o desconhecido, enfim, fazer da leitura uma forma de lazer e, ao mesmo tempo, uma atividade prazerosa.

A IX Bienal Internacional do Livro no Ceará vem, mais uma vez, estimular leitores, ilustradores, escritores nas suas produções literárias, e o grande público em geral, a se tornarem fiéis e verdadeiros amantes da boa leitura.

quarta-feira, 31 de março de 2010

ONDAS DE ALGODÃO

Evan Bessa


Ondas buliçosas derramam-se na areia
brancas, com seus desenhos rendados,
como noiva estendida ao chão, sob o céu azul,
na magia da boda nupcial, com seus bailados.

Outras ondas vão e vem delicadas e serenas
abraçam a noiva que se esgueira na praia,
e recebe o aconchego, num ato de amor,
alimentando a ilusão das ondas que se espraiam.

Brancas ondas escorregam na areia
qual capucho de algodão ao sabor do vento
absorvem cada grão esmaecido de leve,
como a sorver o amor daquele momento.
VIAGEM

Evan Bessa



De olhos bem abertos me pego a observar, através da janela do carro que viajo, trilhas, veredas e caminhos os quais minha memória afetiva se recorda tão bem. Ao longo da estrada, vejo a vegetação esplendorosa cobrindo montes e vales como se um tapete de veludo tivesse sido estendido para que eu pudesse admirar ao retornar a terra natal. O céu estava coberto por nuvens escuras, anunciando que, logo, logo, a chuva cairia em abundância. Serras, serrotes e vales aguardavam adormecidos o banho da chuva que lavaria às suas entranhas, permitindo assim, que uma fragrância fluísse no ar, e exalasse o perfume próprio das matas. As sensações iam surgindo, pouco a pouco, com o cheiro da mata verde e o espelho de água límpida que ia aparecendo, lá embaixo das pontes que atravessava, durante todo o percurso. Despertava minha memória olfativa térmica e, porque não dizer, até mesmo, sabor da água corrente e fresca dos banhos de rio ou cachoeira, experimentados na infância.

Tentei fechar os olhos para que as sensações não fossem tão concretas, mas foi tudo em vão. Cada quilômetro percorrido o coração reclamava da saudade e saltava da mente lembranças em turbilhão, chegando a congestionar imagens e passagens significativas. O tempo, oh! O tempo! Este teima em prosseguir na sua corrida cartesiana sem deixar contornos ou reviravoltas repentinas. Intimamente, ele recua para reviver emoções, coçando a imaginação, como a persistir que o aqui e o agora, daqui a pouco serão passados. A brisa e um vento leve batem no vidro do carro, um frescor escorre na minha face e banha de gotas as lembranças da meninice vivida a correr pelos campos, atrás da passarada e dos animais que faziam fileiras para atravessar a porteira do curral. E aí, as gotas se transformam em chuva de fatos vividos. Recordo o leite mugido tomado na porteira do curral, entregue, carinhosamente, pelas as mãos do ordenhador. Ah! Como sinto agora o sabor e a quentura do líquido milagroso, no copo de alumínio, a roçar meus lábios. O pensamento voa, muito além, da velocidade que o veículo consegue desenvolver.

Tento racionalizar, colocar a razão à frente do objetivo que me faz estar ali, naquele momento, retornando àquela cidade. Algum minuto, paro e penso. Delineio uma agenda gravada na mente, para executar após a chegada ao meu destino, em poucas horas.

Escuto conversas dentro do carro que não me interessam... Em pouco mais de meia hora chegarei.
A estrada parece agora uma esteira rolante na qual trafegam o carro e meus pensamentos. Dou asas à imaginação, e aí vôo mais longe: a casa dos meus avós paternos. Vislumbro um passado remoto pontuado de alegrias prazerosas, impossíveis de serem esquecidas.

O carro pára... Eu absorta em pensamentos volto à realidade. Tenho pouco tempo para cumprir a tal agenda repassada anteriormente. Desço do veículo e passo a agir dentro do roteiro previsto. Não há mais tempo para devaneios, lembranças. O presente, o aqui e o agora me chamam à ação... A viagem termina e com ela as lembranças de um tempo que não volta mais.