A Fragilidade do Ser Humano
Fazia algum tempo que não nos víamos. A dinâmica que a vida nos imprime, os compromissos assumidos, a roda viva do dia-a-dia impossibilitou que nos reaproximássemos. O tempo não espera por ninguém e muito menos quer saber de desculpas ou justificativas. O certo é que a distância nos deixou sem o menor contato.
Ontem, por ocasião de uma missa, reencontrei uma pessoa muito especial. Qual foi a minha surpresa! Havia ali na minha frente, não a criatura que conheci, mas alguém dependente, amparada por duas cuidadoras. Seu estado de saúde demonstrava fragilidade. Olhei um pouco assustada sem querer acreditar no que estava vendo. Imediatamente, minha memória, tal qual um computador, processou um passado não muito distante quando a conheci anos atrás. O paradoxo do antes e do depois parecia uma coisa inaceitável. Aquela moça cheia de vigor, saudável, ativa, inteligente, que gostava de viajar, se divertir, não era a mesma. A colega de faculdade aplicada que se destacava diante da turma pelas notas, trabalhos e discussões em sala de aula, não mais representava aquela figura que guardei na lembrança e que todos nós admirávamos. A educadora competente preocupada em desempenhar bem o seu ofício, pois era vocacionada para o magistério, não era a que eu conheci.
Lecionou por vários anos, concluindo o seu labor na Universidade. Veio de repente em minha mente o que disse Rubem Alves: “Ensinar é um exercício de imortalidade”... Acredito que como mestra ela ficou nos corações de seus milhares de alunos.
Diante de mim havia um ser humano com um olhar distante, sem conseguir ficar de pé sozinha, com dificuldade de reconhecer as pessoas em sua volta. Fiquei perplexa, muda, aflita ao ter que me reapresentar para ela. Ao completar a “apresentação”, ela me fitou e deu um sorriso pálido, triste, inócuo. Parecia não estar conectada com a realidade presente. Mesmo assim, abracei-a com afeto e senti que os seus lábios beijavam a minha face. Emocionada, com os olhos marejados de lágrima, engoli a seco. Senti-me impotente diante de um quadro tão cruel. Desconfiei que ela estivesse sofrendo do mal de Alzheimer, uma vez que conhecia de perto a problemática por ter acompanhado anos de sofrimento meu próprio pai. Mais tarde, pude confirmar a suspeita, depois de falar com seus familiares.
Durante o ato religioso não conseguia me concentrar... O quadro que tinha presenciado me deixou impactada e meus pensamentos em verdadeira turbulência. Foi difícil acompanhar até o final todo o ritual. Meu coração batia mais forte e não conseguia compreender o declínio de uma pessoa com tantos predicados, principalmente, o de saber fazer amigos.
Diz uma lenda chinesa que “amizades verdadeiras são como árvores de raízes profundas: nenhuma tempestade consegue arrancar”. Assim me sinto diante dessa amiga querida, nada vai nos afastar, nem mesmo a doença que a acometeu. Nunca deixarei de admirá-la como um ser humano de valor e de princípios que atravessou meu caminho e, juntas, tivemos a oportunidade de aprender muito uma com a outra.
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
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